PARTE 3: Futebol, ópio do povo - a ideologia das massas.
- elessandromestrado
- 8 de mar.
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Criado por Fabiano Antônio dos Santos – Colégio Estadual Padre João Wilinsk, Curitiba-PR. E Rita de Cássia – Lindaura R. Lucas – São José dos Pinhais-PR. E adaptado por Elessandro Salustiano.
“Esporte é saúde”, “Esporte é Energia”, “Esporte é Integração Nacional". Tudo verdade e tudo mentira. (...) Claro que o esporte ajuda a integração nacional, mas a atenção demasiada aos pés do jogador e do couro da vaca dá desintegração nacional, pois o homem se aposenta de ser consciente e livre (...)”. (NADAL, 1978)
O autor da criação acima está falando de que tipo de consciência? Será que da consciência social, aquela que diferencia o homem de um animal? O que significa ter consciência? Como é formada nossa consciência?

É partir dessa última pergunta que iniciaremos nossa discussão sobre o futebol como ópio do povo. Ópio é um analgésico muito potente, e faz no nosso cérebro funcionar mais devagar. Disto é possível supor o porquê da expressão que relaciona o futebol a uma espécie de contaminação da consciência crítica do ser humano.
A consciência é formada a partir de inúmeras questões de ordem política, que assumem importância em determinados períodos históricos na conformação ou efervescência da população. A ideologia, conceito do qual tanto ouvimos falar, tem, na maioria das vezes, seu real significado pouco discutido. Você já deve ter ouvido falar que cada um tem uma ideologia, ou que devemos ter nossas próprias ideologias. Será que ideologia é, então, a mesma coisa que ideias a serem alcançados por cada um de nós?

Karl Marx (1818-1883), importante pensador na história da humanidade, conceituou ideologia a partir da dinâmica da luta de classes. Ou seja, para ele, a ideologia está colocada na luta entre aqueles que dominam e aqueles que são dominados. Veja um trecho que Marx escreveu sobre ideologia:
Com efeito, cada nova classe que toma o lugar da que dominava antes dela é obrigada, para alcançar os fins a que se propõe, a apresentar seus interesses como sendo o interesse comum de todos os membros da sociedade, isto é, para expressar isso mesmo em termos ideais: é obrigada a emprestar as suas ideias a forma de universidade, a apresenta-las como sendo as únicas racionais, as únicas universalmente válidas. (MARX, 1987, p. 74)
Assim, os dominantes apresentam suas ideias como únicas válidas e verdadeiras e perseguem, excluem ou exterminam aqueles que a contestam. A ditadura militar vivida no Brasil, entre os anos 60 e 80 do século XX, é um bom exemplo disso. Você já ouviu falar das torturas aplicadas àqueles que não “seguiam a ordem” estabelecida, ou contestavam o governo? Do exílio de autoridades e pessoas comuns que fugiam do país para não serem mortas, permitindo que o governo autoritário mantivesse a sua “ordem”? Enfim, nossa história está repleta de acontecimentos em que a ideologia das classes dominantes era imposta como doutrina, impossível de ser contestada.

Mas como a ideologia pode ser transmitida à população? Por meios de vários canais, tais como: a mídia televisiva, os jornais, revistas, discursos, ou até mesmo as leis de censura próprias dos governos autoritários, como foi o caso do Brasil no período do regime militar.
Os defensores do futebol, como ópio do povo, entendiam esse esporte como uma das possibilidades de veiculação ideológica do pensamento da classe dominante.
Na década de 70, para neutralizar a oposição ao regime, o regime fez uso de vários instrumentos de coerção. Da censura aos meios de comunicação, às manifestações artísticas, às prisões, torturas, assassinatos, cassação de mandatos, banimentos do país e aposentadorias forçadas, espalhou-se o medo e a violência. Os setores organizados da sociedade passaram a viver sob um clima de terrorismo, principalmente após o fechamento do Congresso Nacional, em 1996.
Para amenizar essas crises, o governo do presidente Médici (1969-1974) lançou mão do futebol como possibilidade de desviar a atenção da população dos conflitos políticos da época. O objetivo era que, ao invés das pessoas saírem as ruas para participarem de manifestações políticas, ficariam em suas casas torcendo pela seleção brasileira numa “corrente pra frente”, como diz na música de Miguel Gustavo, “Pra frente Brasil”. O governo militar utilizou-se da vitória da seleção, no mundial de 1970, para desviar a atenção da crise econômica, dos problemas sociais e políticos e, principalmente, das atitudes autoritárias relacionadas às torturas, perseguições e mortes, frequentes naquele período triste de nossa história.
Mais recentemente, em 2004, a visita do futebol brasileiro ao Haiti foi o evento que voltou a vincular, ostensivamente, o futebol à função de “ópio do povo”. Muito se falou na mídia a respeito desta visita. Você se lembra das notícias que circularam nesta época?
Procurando realizar nosso exercício, aquele de “espiar” o que estaria escondido atrás das cortinas deste episódio, acompanhemos uma reportagem apresentada ao jornal Folha de São Paulo, realizada em função da visita da seleção brasileira ao Haiti.
Tanto em 1970 como em 2004, o futebol funcionou como válvula de escape para os problemas sociais, ora para o povo brasileiro, de maneira direta; ora indiretamente para o povo haitiano. O interesse do governo Médici e do governo haitiano, nestes dois eventos, foi distrair a população, “aliviar” consequências da instabilidade política do país em questão com o uso do papel simbólico que o futebol assumiu historicamente.
REFERÊNCIAS
NADAL, T. de. Futebol alienação das massas. In.: Revista mundo jovem, Porto Alegre, ano 16, nº 107, março de 1978.
MARX, K.; ENGELS, F. A ideologia Alemã. 6 ed. Trad. José Carlos Bruni e Marco Aurélio Nogueira. São Paulo: Hucitech, 1987.




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